QUE É ISSO, FILOSOFIA, de Martin Heidegger.
Com esta questão tocamos um tema muito
vasto. Por ser vasto, permanece indeterminado. Por ser indeterminado, podemos
tratá-lo sob os mais diferentes pontos de vista e sempre atingiremos algo
certo. Entretanto, pelo fato de, na abordagem deste tema tão amplo, se
interpenetrarem todas as opiniões, corremos o risco de nosso diálogo perder a
devida concentração.
Por isso devemos tentar determinar mais
exatamente a questão. Desta maneira, levaremos o diálogo para uma direção
segura. Procedendo assim, o diálogo é conduzido a um caminho. Digo: a um
caminho. Assim concedemos que este não é o único caminho. Deve ficar mesmo em
aberto se o caminho para o qual desejaria chamar a atenção, no que segue, é na
verdade um caminho que nos permite levantar a questão e respondê-la”.
Assim enceta Heidegger suas elucubrações
sobre o tema: que é isso, a Filosofia? Essas são suas palavras iniciais,
literalmente aqui replicadas porque se mostram fundamentais para se captar a
pretensão do autor, ou seja, indicar um caminho de abordagem ao tema do que vem
a ser a Filosofia.
O autor prossegue questionando a própria
suposição se seremos capazes de encontrar um caminho para responder à questão,
porque no momento em que perguntamos: Que é isto — a filosofia?, falamos,
obviamente, sobre a filosofia e, perguntando desta maneira, localizamo-nos num
ponto acima da filosofia, e isto quer dizer, fora dela. Porém, a meta de nossa
questão é penetrar na filosofia, submeter nosso comportamento às suas leis,
quer dizer, ‘filosofar’. O caminho de nossa discussão deve ter por isso não
apenas uma direção bem clara, mas esta direção deve, ao mesmo tempo,
oferecer-nos também a garantia de que nos movemos no âmbito da filosofia, e não
fora e em torno dela.
Na tentativa de delimitar seu objeto de
estudo, prossegue Heidegger defendendo que a Filosofia não é apenas algo que
pertence ao âmbito da racionalidade, mas que é a própria guarda da razão.
Observa, todavia, que afirmar que a Filosofia é a guarda da razão não nos leva
muito longe, porque nos cabe agora responder: que é isso, a razão? Onde e por quem
foi decidido o que é a razão?
Se aquilo que se apresenta como ratio foi
primeiramente e apenas fixado pela filosofia e na marcha de sua história, então
não é de bom alvitre tratar a priori a filosofia como negócio da ratio.
Todavia, tão logo pomos em suspeição a caracterização da filosofia como um
comportamento racional, torna-se, da mesma maneira, também duvidoso se a
filosofia pertence à esfera do irracional.
É relevante observar um ponto: se, por um
lado, é problemático tomarmos a filosofia como algo racional a priori,
determiná-la como algo irracional é, novamente, tomar o racional como padrão e
pressupor como óbvio o que seja a razão.
Se, por outro lado, apontamos para a
possibilidade de que aquilo a que a filosofia se refere concerne a nós homens
em nosso ser e nos toca, então pode ser que esta maneira de ser afetado não
tenha absolutamente nada a ver com aquilo que comumente se designa como afetos
e sentimentos, em resumo, o irracional.
O autor conclui que do que foi dito até
então, deduzimos inicialmente apenas isto: é necessário maior cuidado se
ousamos inaugurar um encontro com o título: Que é isto — A Filosofia?
Ele escolhe partir da origem grega do termo,
não por motivo vão, mas porque, segundo ele, essa origem nos traz
peculiaridades absolutamente relevantes e reveladoras:
A palavra philosophía diz-nos que a filosofia
é algo que, pela primeira vez, e antes de tudo, vinca a existência do mundo
grego. Não só isto — a philosophía determina também a linha mestra de nossa
história ocidental-européia. A batida expressão “filosofia ocidental-européia”
é, na verdade, uma tautologia. Por quê? Porque a "filosofia" é grega
em sua essência — e grego aqui significa: a filosofia é nas origens de sua
essência de tal natureza que ela primeiro se apoderou do mundo grego e só dele,
usando-o para se desenvolver.
A frase: a filosofia é grega em sua essência,
não diz outra coisa que: o Ocidente e a Europa, e somente eles, são, na marcha
mais íntima de sua história, originariamente “filosóficos”. Isto é atestado
pelo surto e domínio das ciências. Pelo fato de elas brotarem da marcha mais
íntima da história ocidental-européia, o que vale dizer do processo da
filosofia, são elas capazes de marcar hoje, com seu cunho específico, a
história da humanidade pelo orbe terrestre.
A tradição designada pelo nome grego
philosophía, tradição nomeada pela palavra historial philosophía, mostra-nos a
direção de um caminho. Ela não nos entrega à prisão do passado e irrevogável.
Transmitir, delivrer é um libertar para a liberdade do diálogo com o que foi e
continua sendo. Se estivermos verdadeiramente atentos à palavra e meditarmos o
que ouvimos, o nome “filosofia” nos convoca para penetrarmos na história da
origem grega da filosofia. A palavra philosophía está, de certa maneira, na
certidão de nascimento de nossa própria história; podemos mesmo dizer: ela está
na certidão de nascimento da atual época da história universal que se chama era
atômica. Por isso somente podemos levantar a questão: Que é isto — a
filosofia?, se começamos um diálogo com o pensamento do mundo grego. Porém, não
apenas aquilo que está em questão, a filosofia, é grego em sua origem, mas
também a maneira como perguntamos, mesmo a nossa maneira atual de questionar
ainda é grega.
Perguntamos: que é isto...? Em grego isto é:
ti estin. A questão relativa ao que algo seja permanece, todavia, multívoca.
Podemos perguntar, por exemplo: que é aquilo lá longe? Obtemos então a
resposta: uma árvore. A resposta consiste em darmos o nome a uma coisa que não
conhecemos exatamente.
Podemos, entretanto, questionar mais: que é
aquilo que designamos “árvore"? Com a questão agora posta avançamos para a
proximidade do ti estin grego. É aquela forma de questionar desenvolvida por
Sócrates, Platão e Aristóteles. Estes perguntam, por exemplo: Que é isto — o
belo? Que é isto — o conhecimento? Que é isto — a natureza? Que é isto — o
movimento?
Agora, porém, devemos prestar atenção para o
fato de que nas questões acima não se procura apenas uma delimitação mais exata
do que é natureza, movimento, beleza; mas é preciso cuidar para que ao mesmo
tempo se dê uma explicação sobre o que significa o “que”, em que sentido se
deve compreender o ti. Aquilo que o ‘que’ significa se designa o quid est, tò
quid: a quidditas, a qüididade. Entretanto, a quidditas se determina
diversamente nas diversas épocas da filosofia. Assim, por exemplo, a filosofia
de Platão é uma interpretação característica daquilo que quer dizer o ti. Ele
significa precisamente a idéia. O fato de nós, quando perguntamos pelo ti, pelo
quid, nos referimos à “idéia” não é absolutamente evidente. Aristóteles dá uma
outra explicação do ti que Platão. Outra ainda dá Kant e também Hegel explica o
tí de modo diferente. Sempre se deve determinar novamente aquilo que é
questionado através do fio condutor que representa o ti, o quid, o “que”. Em
todo caso: quando, referindo-nos à filosofia, perguntamos: que é isto?,
levantamos uma questão originariamente grega.
Notemos bem: tanto o tema de nossa
interrogação: “a filosofia”, como o modo como perguntamos: “que é isto...?” —
ambos permanecem gregos em sua proveniência. Nós mesmos fazemos parte desta
origem, mesmo então quando nem chegamos a dizer a palavra “filosofia”. Somos
propriamente chamados de volta para esta origem, reclamados para ela e por ela,
tão logo pronunciemos a pergunta: Que é isto — a filosofia? não apenas em seu
sentido literal, mas meditando seu sentido profundo.
Se penetrarmos no sentido pleno e originário
da questão: Que é isto — a filosofia? então nosso questionar encontrou, em sua
proveniência historial, uma direção para nosso futuro historial. Encontramos um
caminho. A questão mesma é um caminho. Ele conduz da existência própria ao
mundo grego até nós, quando não para além de nós mesmos. Estamos — se
perseverarmos na questão — a caminho, num caminho claramente orientado. Já
desde há muito tempo costuma-se caracterizar a pergunta pelo que algo é, como a
questão da essência. A questão da essência torna-se mais viva quando aquilo por
cuja essência se interroga, se obscurece e confunde, quando ao mesmo tempo a
relação do homem para com o que é questionado se mostra vacilante e abalada.
A questão de nosso encontro refere-se à
essência da filosofia. Ela procura o que é o ente enquanto é. A filosofia está
a caminho do ser do ente, quer dizer, a caminho do ente sob o ponto de vista do
ser.
E por isso que a filosofia é epistéme
theoretiké. Mas que é isto que ela perscruta?
Aristóteles di-lo, fazendo referência às
pròtai arkhai kai aitíai. Costuma-se traduzir: “as primeiras razões e causas” —
a saber, do ente. As primeiras razões e causas constituem assim o ser do ente.
Após dois milênios e meio me parece que teria chegado o tempo de considerar o
que afinal tem o ser do ente a ver com coisas tais como “razão” e “causa”. Em
que sentido é pensado o ser para que coisas tais como “razão” e “causa” sejam
apropriadas para caracterizarem e assumirem o sendo-ser do ente?
A citada afirmação de Aristóteles diz-nos
para onde está a caminho aquilo que se chama, desde Platão, “filosofia”. A afirmação
nos informa sobre isto que é — a filosofia. A filosofia é uma espécie de
competência capaz de perscrutar o ente, a saber, sob o ponto de vista do que
ele é, enquanto é ente.
Mas a afirmação de Aristóteles sobre o que é
a filosofia não pode ser absolutamente a única resposta à nossa questão. No
melhor dos casos, é ela uma resposta entre muitas outras. Com o auxilio da
caracterização aristotélica de filosofia pode-se evidentemente representar e
explicar tanto o pensamento antes de Aristóteles e Platão quanto a filosofia
posterior a Aristóteles. Entretanto, facilmente se pode apontar para o fato de
que a filosofia mesma, e a maneira como ela concebe sua essência, passou por
várias transformações nos dois milênios que seguiram o Estagirita. Quem ousaria
negá-lo? Mas não podemos passar por alto o fato de a filosofia de Aristóteles e
Nietzsche permanecer a mesma, precisamente na base destas transformações e
através delas. Pois as transformações são a garantia para o parentesco no
mesmo.
De nenhum modo afirmamos com isto que a
definição aristotélica de filosofia tenha valor absoluto. Pois ela é já em meio
à história do pensamento grego uma determinada explicação daquele pensamento e
do que lhe foi dado como tarefa. A definição aristotélica de filosofia certamente
é livre continuação da aurora do pensamento e seu encerramento. Digo livre
continuação porque de maneira alguma pode ser demonstrado que as filosofias
tomadas isoladamente e as épocas da filosofia brotam uma das outras no sentido
da necessidade de um processo dialético.
Do que foi dito, que resulta para nossa
tentativa de, num encontro, tratarmos a questão: Que é isto — a filosofia?
Primeiramente um ponto: não podemos ater-nos apenas à definição de Aristóteles.
Disto deduzimos o outro ponto: devemos ocupar-nos das primeiras e posteriores
definições de filosofia.
A resposta somente pode ser uma resposta
filosofante, uma resposta que enquanto resposta filosofa por ela mesma.
Quando é que a resposta à questão: Que é isto
— a filosofia? é uma resposta filosofante? Quando filosofamos nós?
Manifestamente apenas então - quando entramos em diálogo com os filósofos.
Disto faz parte que discutamos com eles aquilo de que falam. Este debate em
comum sobre aquilo que sempre de novo, enquanto o mesmo, é tarefa específica
dos filósofos, é o falar, o légein no sentido do dialégesthai, o falar como
diálogo. Se e quando o diálogo é necessariamente uma dialética, isto deixamos
em aberto.
Supondo, portanto, que os filósofos são
interpelados pelo ser do ente para que digam o que o ente é, enquanto é, então
também nosso diálogo com os filósofos deve ser interpelado pelo ser do ente.
O ente enquanto tal dis-põe de tal maneira o
falar que o dizer se harmoniza (accorder) com o ser do ente.
Para Platão e Aristóteles, o espanto é a
dis-posição (1) na qual e para a qual o ser do ente se abre, o espanto é a
dis-posição em meio à qual estava garantida para os filósofos gregos a
correspondência ao ser do ente.
De bem outra espécie é aquela dis-posição que
levou o pensamento a colocar a questão tradicional do que seja o ente enquanto
é, de um modo novo, e a começar assim uma nova época da filosofia. Descartes,
em suas meditações, não pergunta apenas e em primeiro lugar ti tò ón — que é o
ente, enquanto é?
Descartes pergunta: qual é aquele ente que no
sentido do ens certum é o ente verdadeiro? Para Descartes, entretanto, se
transformou a essência da certitudo.
Para Descartes, aquilo que verdadeiramente é
se mede de uma outra maneira. Para ele a dúvida se torna aquela dis-posição em
que vibra o acordo com o ens certum, o ente que é com toda certeza. A certitudo
torna-se aquela fixação do ens qua ens, que resulta da indubitabilidade do
cogito (ergo) sum para o ego do homem. Assim, o ego se transforma no sub-iectum
por excelência, e, desta maneira, a essência do homem penetra pela primeira vez
na esfera da subjetividade no sentido da egoidade. Do acordo com esta certitudo
recebe o dizer de Descartes a determinação de um clare et distincte percipere.
A dis-posição afetiva da dúvida é o positivo acordo com a certeza. Daí em
diante a certeza se torna a medida determinante da verdade. A dis-posição
afetiva da confiança na absoluta certeza do conhecimento a cada momento
acessível permanece o páthos e com isso a arkhé da filosofia moderna.
Mas em que consiste o télos, a consumação da
filosofia moderna, caso disto nos seja permitido falar? É este termo
determinado por uma outra dis-posição? Onde devemos nós procurar a consumação
da filosofia moderna? Em Hegel ou apenas na filosofia dos últimos anos de
Schelling? E que acontece com Marx e Nietzsche? Já se movimentam eles fora da
órbita da filosofia moderna? Se não, como determinar seu lugar?
Parece até que levantamos apenas questões
históricas. Mas na verdade meditamos o destino essencial da filosofia.
Procuramos pôr-nos à escuta da voz do ser. Qual a dis-posição em que ela
mergulha o pensamento atual? Uma resposta unívoca a esta pergunta é
praticamente impossível. Provavelmente impera uma dis-posição afetiva
fundamental. Ela, porém, permanece oculta para nós. Isto seria um sinal para o
fato de que nosso pensamento atual ainda não encontrou seu claro caminho. O que
encontramos são apenas dis-posições do pensamento de diversas tonalidades.
Dúvida e desespero de um lado e cega prossessão por princípios, não submetidos
a exame, de outro, se confrontam.
Medo e angústia misturam-se com esperança e
confiança. Muitas vezes e quase por toda parte reina a idéia de que o
pensamento que se guia pelo modelo da representação e cálculo puramente lógicos
é absolutamente livre de qualquer dis-posição. Mas também a frieza do cálculo,
também a sobriedade prosaica da planificação são sinais de um tipo de
dis-posição. Não apenas isto; mesmo a razão que se mantém livre de toda
influência das paixões é, enquanto razão, pré-dis-posta para a confiança na
evidência lógico-matemática de seus princípios e regras. (2)
A correspondência propriamente assumida e em
processo de desenvolvimento, que corresponde ao apelo do ser do ente, é a
filosofia. Que é isto — a filosofia? somente aprendemos a conhecer e a saber
quando experimentamos de que modo a filosofia é. Ela é ao modo da
correspondência que se harmoniza e põe de acordo com a voz do ser do ente. Este
co-responder é um falar. Está a serviço da linguagem. O que isto significa é de
difícil compreensão para nós hoje, pois nossa representação comum da linguagem
passou por um estranho processo de transformações.
Como conseqüência disso a linguagem aparece
como um instrumento de expressão. (3) De acordo com isso, tem-se por mais
acertado dizer que a linguagem está a serviço do pensamento em vez de: o
pensamento como correspondência está a serviço da linguagem. Mas, antes de
tudo, a representação atual da linguagem está tão longe quanto possível da
experiência grega da linguagem. Aos gregos se manifesta a essência da linguagem
como lógos.
Mas o que significa lógos e légein? Apenas
hoje começamos lentamente, através de múltiplas interpretações do lógos, a
descerrar para nossos olhos o véu sobre sua originária essência grega.
Entretanto, nós não somos capazes nem de um dia regressar a esta essência da
linguagem, nem de simplesmente assumi-la como herança. Pelo contrário, devemos
entrar em diálogo com a experiência grega da linguagem como lógos. Por quê?
Porque nós, sem uma suficiente reflexão sobre a linguagem, jamais sabemos
verdadeiramente o que é a filosofia como a co-respondência acima assinalada, o
que ela é como uma privilegiada maneira de dizer.
Agora, porém, haveria boas razões para exigir
que nosso encontro se limitasse à questão que trata da filosofia. Esta
restrição seria só então possível e até necessária, se do diálogo resultasse
que a filosofia não é aquilo que aqui lhe atribuímos: uma correspondência, que
manifesta na linguagem o apelo do ser do ente.
Com outras palavras: nosso encontro não se
propõe a tarefa de desenvolver um programa fixo. Mas ele quisera ser um esforço
de preparar todos os participantes para um recolhimento em que sejamos
interpelados por aquilo que designamos o ser do ente. Nomeando isto, pensamos
no que já Aristóteles diz: Tò òn légetai pollakhõs.
“O sendo-ser torna-se, de múltiplos modos,
fenômeno”.
NOTAS
1. Dis-posição (Stimmung) é um originário
modo de ser do ser-aí, vinculado ao sentimento de situação (Befindlichkeit) que
acompanha a derelicção (Geworfenheift). Pela dis-posição (que nada tem a ver
com tonalidades psicológicas) o ser-no-mundo é radicalmente aberto. Esta
abertura antecede o conhecer e o querer e é condição de possibilidade de
qualquer orientar-se para próprio da intencionalidade (veja -se Ser e Tempo, §
29). Jogando com a riqueza semântica das derivações de Stimmung: bestimmt,
gestimmt, abstirnmen, Ges!imnitheit, Bestimmtheit, Heidegger procura tornar
claro como esta disposição é uma abertura que determina a correspondência ao
ser, na medida em que é instaurada pela voz (Stimme) do ser. O filósofo toca
aqui nas raízes do comportamento filosófico, da atitude originalmente do
filosofar. (N. do T.).
2. Já em Ser e Tempo (§ 29) se alude à
dis-posição que acompanha a teoria e se afirma que “o conhecimento ávido por
determinações lógicas se enraíza ontológica e existencialmente no sentido de
situação, característico do ser-no-mundo (p. 138). Apontando para o fato de que
a própria razão está pre-dis-posta para confiar na evidência lógico-matemática
de seus princípios e regras, Heidegger fere um tabu que os sucessos da técnica
ainda mais sacralizam. Mas, desde que Habermas, em seu livro Conhecimento e
Interesse (Ed. Shurkamp, Frankfurt a. M. 1968), mostrou que atrás de todo conhecimento
existe o interesse que o dirige, que a teoria quanto mais pura se quer mais se
ideologiza, pode-se descobrir, nas afirmações de Heidegger, uma antecipação das
razões ontológico-existenciais da mistura do conhecimento e interesse. Não há
conhecimento imune ao processo de ideologização; dele não escapa nem mesmo o
conhecimento científico, por mais exato, rigoroso e neutro que se proclame. (N.
do T.).
3. A crítica da instrumentalização da
linguagem visa a proteger o sentido, a dimensão conotadora e simbólica, contra
a redução da linguagem ao nível da denotação, do simplesmente operativo. Não se
trata apenas de salvar a mensagem lingüística da ameaça da pura semioticidade.
O filósofo descobre na linguagem o poder do lógos, do dizer como processo apofântico;
entrevê na linguagem a casa do ser, onde o homem mora nas raízes do humano. Em
Heidegger, uma ontologia já impossível é substituída pela critica da linguagem,
numa antecipação da moderna analítica da linguagem. (N. do T.).
Utilizada a Versão eletrônica do livro “Que é
isto – A Filosofia? (Qu’est-ce que la Philosophie?)”.
Tradução e notas: Ernildo Stein
Créditos da digitalização: Membros do grupo
de discussão Acrópolis (Filosofia)
Responsável: Lilia Pinheiro
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