Sobre o Ensino de São Tomás de Aquino (Resumo)



Sobre o ensino de Tomás de Aquino aborda a questão da verdade e está estruturado como questio disputata, conforme essência da educação escolástica. Assim no texto, define-se um tema, apresenta-se uma tese, e as teses em contrário, para em seguida, a solução às objeções serem apresentadas pelo mestre.

O livro está dividido em 4 artigos, sendo o primeiro, se o homem, ou somente Deus, pode ensinar e ser chamado de mestre. No segundo artigo se pode dizer que alguém é mestre de si mesmo. Se o homem pode ser ensinado por um anjo, no terceiro artigo e no quarto, se ensinar é um ato da vida ativa ou da vida contemplativa. 

As objeções inicias (artigo 1) propõem que ninguém pode ensinar, e são levantadas as premissas. 

Quando um homem apresenta sinais a outro, duas são as possibilidades. Se ele já conhece as realidades sinalizadas ou não. Se já conhece, não houve ensino. Se não conhece, não poderá aprender, pois não sabe os significados. 

Ensinar é causar conhecimento intelectual em outro. E esse conhecimento reside no intelecto, enquanto os sinais no sensível. E ao que parece o único meio de ensinar é pelo sensível, não atingindo o intelectivo. 

Se o conhecimento é causado por outro ou já estava no aluno ou não. Se foi causado por outro homem, teríamos um homem criando conhecimento em outro, o que é impossível. Se nele já estava, não poderia ser causado. 

O conhecimento é um acidente, e o acidente não muda de sujeito. O ensino ao que parece, passa do mestre ao discípulo. Logo, um homem não pode ensinar a outro. 

O conhecimento é causado internamento na mente, e não externamente no sentido. Portanto o homem pode ser ensinado somente por Deus. 

O homem não ensina, mas somente dispõe das coisas para que ocorra o conhecimento. 

Se o homem é professor, é necessário que ensine a verdade. Quem quer que ensine a verdade, ilumina a mente. O homem não pode iluminar a mente conforme as escrituras. 

O conhecimento é a assimilação da coisa conhecida pelo cognoscente. Mas um homem não pode representar na alma de outro, pois assim operaria internamente, o que só é dado a deus. 

Segundo Boécio, pelo ensino a mente do homem somente é estimulada a conhecer. Mas aquele que estimula não produz nele o conhecimento. 

O saber requer certeza do conhecimento. Um homem não pode produzir no outro certeza por meio de sinais sensíveis. 

Teses em Contrário

Após estabelecidas as principais premissas, seguem as teses em contrário. O homem pode ensinar. 

Paulo diz no evangelho que foi estabelecido como pregador e mestre. Logo o homem pode ensinar e ser chamado de mestre. 

Em romanos é dito, “estes são os pés que iluminam a Igreja. Iluminar é um ato de quem ensina. 

Aristóteles diz que uma coisa é perfeita quando pode gerar um em seu semelhante. O saber é um conhecimento perfeito. 

Solução para as teses e teses em contrário. 

Todas as formas sensíveis derivam de um agente extrínseco, que é uma substancia ou forma separada. 

Todas essas formas seriam imanentes as coisas e não tem causa exterior, mas simplesmente se manifestam por ação provinda do exterior. 

Ambas as opiniões carecem de fundamentos racionais. É necessário sustentar uma terceira via, intermediária. O conhecimento preexiste no educando como potência não puramente passiva, mas ativa, senão o homem não poderia adquirir conhecimentos por si mesmo. 

Há duas formas de adquirir conhecimento: quando a razão por si mesma atinge o conhecimento que não possuía, e de outro, quando recebe ajuda de fora, e este modo se chama ensino. 

O professor deve conduzir o aluno ao conhecimento que ele por si só ignorava, seguindo o caminho trilhado por alguém que chega por si mesmo à descoberta do que não conhecia. 

Do mesmo modo que se diz que o médico causa a saúde no doente pela atuação da natureza, também se diz que o professor causa o conhecimento no aluno com a atividade da razão natural do aluno. E é nesse sentido que se diz que um homem ensina a outro e se chama mestre. 

Resposta às objeções 

É o conhecimento dos princípios (e não o conhecimento dos sinais) que produz em nós o conhecimento das conclusões. No aluno, o conhecimento já existia, mas não em ato perfeito, e sim como que em “razões seminais”, inscritas em nós, são como que sementes de todos os conhecimentos posteriores. 

O professor infunde o conhecimento no aluno não no sentido numérico, de que o conhecimento do mestre passe ao aluno. Mas porque pelo ensino, se produz passando de potência para ato um conhecimento semelhante ao que há no mestre. 

Um professor ensina a verdade e ilumina a mente, não porque infunda a luz da razão em outro, mas como que ajudando essa luz da razão para a perfeição do conhecimento, por meio daquilo que propõe exteriormente. 

No segundo artigo a tese levantada é a possibilidade do homem ser mestre de si mesmo. 

Objeções

A certeza do conhecimento nos é dada pelos princípios que radicam em nós naturalmente pela luz do intelecto agente. Assim como se atinge a virtude por si mesmo ou por meio de outros, assim também alguém pode chegar ao conhecimento por si mesmo, pela descoberta, ou por meio de outros, pelo ensino. 

O professor, como vimos, é causa do conhecimento como o médico o é da saúde. Ora, o médico pode curar a si mesmo e, do mesmo modo, alguém pode ensinar a si mesmo. 

Teses em contrário

É impossível que o professor aprenda (aquilo que ele está a ensinar). Pois como docente deve ter o conhecimento e como discente não pode ter. 

Solução

Com a luz da razão que nele radica, alguém pode, sem ajuda de um ensino exterior, chegar ao conhecimento de muitas coisas ignoradas, como é evidente em todos aqueles conhecimentos que alguém descobre. Porém nem por isso se pode chamar propriamente de mestre de si mesmo. 

Resposta as objeções

O intelecto agente, em relação ao conhecimento, é causa mais importante do que o homem que ensina, não preexiste nele o conhecimento completo como professor e, portanto, o argumento não procede. 

Se o modo de aquisição por descoberta é mais perfeito por quem recebe o conhecimento, pois manifesta maior habilidade, no entanto, por parte de quem causa o conhecimento, é mais perfeito o que se adquire pelo ensino, porque o professor pode conduzir ao conhecimento de modo mais simples. 

O médico cura não porque tem a saúde em ato, mas porque tem o conhecimento da arte médica. O professor ensina precisamente porque tem o conhecimento em ato. Assim pode causar a saúde em si mesmo, quem não a tendo em ato, tem o conhecimento da arte médica. O que não pode se dar é que alguém que tenha o conhecimento em ato e não tenha para poder ensinar a si mesmo. 

No terceiro artigo é debatida a possibilidade do homem ser ensinado por um anjo. Nas objeções iniciais os anjos não podem ensinar. 

Se um anjo ensina, o faz interiormente ou exteriormente. O anjo não ensina interiormente, pois a isso compete somente a Deus. E para ensinar exteriormente, eles precisariam aparecer sensivelmente, o que só acontece que por milagre. 

Sempre que um ensina a outro, o aluno confere os conceitos do professor a fim de que o processo na mente do aluno acompanhe o processo do conhecimento na mente do professor. O homem não pode ver os conceitos do anjo. Logo, os anjos (a não ser por aparição sensível) não podem ensinar os homens. 

Quem quer que ensine deve manifestar a verdade, mas a verdade, sendo uma luz inteligível, é para nós mais manifesta do que um anjo. 

Tudo o que se conhece, ou é conhecido pela sua essência ou por sua semelhança. Do mesmo modo, eles [anjos] não podem causar o conhecimento das coisas por semelhança, pois as realidades a serem conhecidas estão mais próximas de suas semelhanças no cognoscente do que nos anjos. 

Argumentos em contrário, os anjos podem ensinar 

A ordem da sabedoria divina se acha mais perfeitamente nas substâncias espirituais do que nas corpóreas. Mas é próprio das ordens inferiores que os corpos inferiores consigam suas perfeições por influxo dos corpos superiores. 

Tudo o que está em potência pode ser conduzido a ato por algo que está em ato e o que está menos em ato por algo que está em ato mais perfeito. O intelecto angélico está em ato mais do que o humano. Daí que o intelecto humano possa ser conduzido ao ato do conhecimento pelo intelecto angélico. 

Solução

O homem recebe o conhecimento daquilo que ignorava por meio de dois fatores: pela luz intelectual e pelos primeiros conceitos, evidentes, que estão para aquela luz (que é o intelecto agente) como os instrumentos para o artífice. 

O anjo possui naturalmente uma luz intelectual mais perfeita do que a do homem, e pode ser causa do conhecimento, se bem que de modo inferior ao de Deus, mas superior ao do homem. Quanto à luz, se bem que não possa infundir a luz intelectual como o faz Deus, pode, no entanto, fortalecer a luz infusa para que o homem veja mais perfeitamente. 

Resposta às objeções

O anjo ensina a modo de agente equívoco: ele conhece intelectualmente aquilo que ao homem se manifesta por meio da razão; daí que o homem não seja ensinado pelo anjo do mesmo modo como os conceitos se manifestam ao anjo, mas causando o conhecimento no homem de um modo profundamente distinto de como o próprio anjo conhece. 

Quem ensina não causa a verdade, mas o conhecimento da verdade no aluno. Daí que as proposições que são ensinadas são verdadeiras antes de serem conhecidas, pois a verdade não depende de nosso conhecimento, mas da existência das coisas. 

Para finalizar o livro De Magistro, Aquino aborda no artigo quatro, se ensinar é um ato da vida ativa ou da vida contemplativa. A tese inicial é que ensinar seja próprio da vida contemplativa.

A vida ativa ocupa-se das realidades temporais, mas o ensino versa principalmente sobre as realidades eternas, pois este ensino é o mais excelente e perfeito. 

Em contrário

As obras de misericórdia pertencem à vida ativa e o ensinar é enumerado como uma das obras de misericórdia. Logo, o ensinar é ato da vida ativa. 

Solução

A vida contemplativa e a vida ativa distinguem-se pelo fim e pela matéria. A matéria da vida ativa são as realidades temporais sobre as quais versam os atos humanos, a matéria da vida contemplativa são as essências inteligíveis das coisas, sobre as quais se detém o contemplativo. 

No ato de ensinar encontramos uma dupla matéria. Ensina-se - uma matéria – a própria realidade de que trata o ensino e ensina-se – segunda matéria – alguém, a quem o conhecimento é transmitido. Em função da primeira matéria, o ato de ensinar é próprio da vida contemplativa, em função da segunda, da ativa. Quanto ao fim, o ensino é exclusivamente da vida ativa, pois sua ultima matéria, na qual se atinge o fim proposto, é matéria da vida ativa. 

Resposta as objeções

A boa ordenação da vida é que da vida ativa se tenda à contemplativa. É, no entanto, necessário saber que a vida ativa precede à contemplativa naqueles atos que por matéria não dizem respeito à vida contemplativa; quanto, porém, aos atos que recebem a matéria da vida contemplativa, é necessário que a vida contemplativa preceda a ativa. A vida contemplativa é o principio da vida ativa, enquanto a dirige.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

O Mito da Caverna por Marilena Chauí

GUIOMAR DE GRAMMONT: LER DEVIA SER PROIBIDO

A PASSAGEM DO MITO PARA A FILOSOFIA